quinta-feira, 12 de abril de 2012

Fotógrafo conta em fotos e histórias como vivem os hereros de Angola


Mostra 'Hereros' (Foto: Divulgação / Sergio Guerra)Detalhe de foto de uma herera (Foto: Divulgação /
Sergio Guerra)
O fotógrafo e publicitário Sergio Guerra viu crianças serem batizadas em sua homenagem, já salvou vidas e até recusou a oferta de maridos para que se relacionasse com alguma de suas esposas. Em 15 anos desde o primeiro contato com os hereros, um dos mais antigos grupos étnicos africanos, sobram histórias e imagens.

A partir desta sexta-feira (13) até 8 de julho, ele expõe no Museu Histórico Nacional, no Centro do Rio de Janeiro, em 120 fotos dispostas em um cenário caracterizado por objetos, adereços e vestimentas, um pouco da sua experiência, já contada, em parte, no livro "Hereros - Angola" (Edições Maianga), mesmo nome da exposição. Em julho, lança ainda um documentário, já em fase de pós-produção, em que retrata como vive este povo, com registros de imagens desde nascimentos até mortes.
Guerra iniciou sua relação com Angola em 1997, quando foi prestar assessoria a um instituto semelhante ao Sebrae. Dois anos depois, foi chamado para trabalhar a comunicação do governo do país durante a guerra civil. O primeiro contato com os hereros foi durante viagem às províncias de Huíla e Namibe para as gravações de um programa de televisão. Após idas esporádicas, o pernambucano do Recife, que hoje se divide entre Rio, Salvador e Angola, começou a desenvolver uma proximidade com o grupo há quatro anos, quando começou o projeto que se desdobrou no livro, na exposição e no futuro longa, que entrará no circuito de festivais.
"Eles me ensinaram que o grande desafio do homem moderno é exercer a sua racionalidade. São extremamente racionais. Primitivos somos nós, que chegamos ao século 21 e não conseguimos resolver o problema mais básico que é fome", analista Guerra.
Segundo ele, os homens hereros acumulam três ou quatro mulheres e comumente oferecem uma delas para amigos muito queridos, por uma noite. "Já me ofereceram algumas, mas, apesar da minha curiosidade antropológica, recusei", diz, lembrando que as doenças sexuamente transmissíveis, como aids, são problema grave na região.
Mãe e filho dos hereros, em uma das 120 fotos de Sergio Guerra que estão na mostra (Foto: Divulgação / Sergio Guerra)Mãe e filho dos hereros, em uma das 120 fotos de Guerra que estão na mostra (Foto: Divulgação / Sergio Guerra)
Mesmo com a poligamia patriarcal, as esposas também podem dar suas escapadas. Ciúme, para os hereros, é sentimento primitivo. "O marido sai, fica meses fora e, quando regressa, a mulher está grávida. Ele fica feliz: 'Mais uma pessoa vai ajudar a gente', pensa. O filho é dele e não se discute. Tenho o depoimento de um mais velho, que diz: ‘Esse negócio de ciúmes, nossos antepassados tinham. Percebemos que não era bom e acabamos com isso'", conta.
De três a quatro vezes por ano, Guerra passa entre uma semana e 20 dias com os hereros. Já se tornou uma espécie de padrinho dos povoados. Até vida já salvou. Cerca vez, levou uma grávida com complicações no parto para o posto médico mais próximo (cerca de quatro horas de viagem) e evitou sua morte. Por essas e outras, já soma três crianças batizadas em sua homenagem, como a pequena Muka Guerra. "Muka quer dizer mulher", explica.
Apoio social
O dinheiro arrecadado com a venda das fotos é revertido para os hereros. Um jipe, fundamental para percorrer as estradas em péssimas condições que ligam os povoados, e uma escolinha, são os primeiros benefícios conseguidos por Guerra, que é responsável pela Fundação Negro Amor, com sede em Salvador, que faz projetos sociais na Bahia.
"Eles já foram muito explorados. É muito comum na África você ver os safáris fotográficos, em que as pessoas chegam, fotografam e vão embora. Não oferecem nada. Essa é uma característica do meu trabalho usar a fotografia como ferramenta de observação e de intervenção. Eles entenderam que tinham a possibildiade de ganhar um protagonismo", comenta Guerra.
A mostra "Herreros - Angola" já foi vista por 185 mil pessoas em São Paulo e Brasília e teve passagens por Lisboa, em Portugal, e Luanda, capital angolana. A curadoria é do artista plástico e diretor do Museu Afro Brasil Emanoel Araujo.

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